Por Luciana Freitas
Todo edifício, por mais simples que seja, contém sistemas e equipamentos que demandam cuidados, tanto em sua operação rotineira como na manutenção (preventiva ou corretiva). Quando o gerenciamento destes sistemas acontece por meio da automação, trata-se da Automação Predial. Os mais comuns estão ligados a sistemas como o hidráulico (níveis dos reservatórios, controle das bombas); energia (geradores, nobreaks); iluminação das áreas comuns; climatização e aquecimento, entre outros. E vale ressaltar ainda a forte sinergia que está surgindo com os sistemas de segurança eletrônica das edificações (controle de acesso, alarmes, câmeras de vigilância) que, quando integrados aos sistemas de automação predial, genericamente conhecidos como Building Management Systems (BMS), também potencializam a eficiência e a segurança.
Os BMS estão se tornando cada vez mais presentes nas edificações conforme sua tecnologia tem evoluído para as atividades de supervisão e comando através de “nuvem”. Hoje em dia, depende-se cada vez menos de hardwares cuja instalação e manutenção sempre representaram um limitador no investimento para equipamentos conectados à Internet e que podem fornecer informações em tempo real para garantir a operação eficiente das edificações onde estão instalados. Além disso, sistemas de automação predial também possibilitam um gerenciamento remoto, um aliado na redução de custos e no aumento da eficiência energética.
Sistemas mais “tradicionais” são cabeados e utilizam protocolos consolidados na área de BMS, que fornecedores, projetistas e integradores já adotam há vários anos e que reúnem as condições necessárias de robustez e interoperabilidade. De acordo com José Roberto Muratori, engenheiro pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP) e diretor-executivo da Associação Brasileira de Automação Residencial e Predial (Aureside), houve uma significativa evolução nos aplicativos para uso remoto, o que permitiu mudar o conceito anterior de uma “sala de operações” fixa, onde colaboradores passavam os seus dias acompanhando as ocorrências do prédio. “Hoje, a flexibilidade e a mobilidade são vitais e tornam a gestão muito mais ágil. Tecnologias que operam sem fio e através das redes Wi-Fi também estão assumindo um importante papel nesta mudança de conceitos”, afirma.
Um bom sistema de automação predial deve garantir um funcionamento eficiente, reduzindo custos operacionais e de manutenção. Como resultados adicionais, pode-se mencionar maior segurança da edificação (seja contra riscos patrimoniais ou contra acidentes), conforto ambiental ampliado para seus usuários e retorno sobre o investimento efetuado.
Segundo Moisés Younes Quatrin, engenheiro eletricista e engenheiro de Produto na ABB Brasil, existem empreendimentos que simplesmente não são gerenciáveis do ponto de vista financeiro, se não contarem com um alto nível de automação. “O investimento em automação traz como principal retorno a economia de recursos, sejam eles energia elétrica, gás, água ou recursos humanos. Isto reflete diretamente no custo financeiro de operação dos empreendimentos, podendo reduzir pela metade seu custo de manutenção de um empreendimento. É importante lembrar dos pilares: conforto, eficiência e segurança”, destaca.
A economia no consumo de energia elétrica é o principal item a ser levado em consideração. Uma grande cadeia brasileira de hospitais realizou um levantamento para identificar qual seria o maior ofensor atual no consumo energético em suas edificações hospitalares. O estudo feito em mais de 50 edifícios descobriu que o ar-condicionado representava em torno de 50% da conta de eletricidade. A automação predial tem uma atuação crucial no Heating, Ventilation and Air Conditioning (HVAC), fazendo o controle para obter o máximo com o mínimo de esforço.
Normalmente, os vilões do consumo de energia elétrica são sistemas de climatização, de aquecimento, uso e tratamento de água e da iluminação das áreas comuns, mas depende muito do tipo de condomínio e da sua utilização.
A eficiência operacional é outro aspecto essencial. “Imagine um edifício com 300 circuitos de iluminação. Só para ligar estes circuitos pela manhã e desligá-los à noite, o responsável, sem a automação, teria de passar metade do dia visitando quadros para ligar e a outra metade para desligar esses circuitos”, exemplifica a diretora do segmento Buildings para América do Sul da Schneider Electric, Ana Lúcia Salmeron.
Outro ponto está relacionado à segurança da própria edificação e de seus ocupantes. “Estamos falando de segurança física mesmo, quando utilizamos de um controle de acesso, permitindo ou bloqueando a entrada de pessoas a um determinado recinto. Quando se monitora as condições de elevadores, detectores de fumaça e instalações elétricas, a automação entrega uma redução drástica nos riscos de acidentes”, comenta a executiva da Schneider Electric.
Um quarto item se refere à saúde dos ocupantes. Os cuidados com a qualidade do ar nos ambientes fechados dos prédios são cruciais para manter a boa saúde de seus usuários. Mas não somente com o ar. A água armazenada para consumo, a preocupação com riscos de choques e os gases acumulados em pontos específicos são exemplos de benefícios em relação à saúde que a automação proporciona.
Por último, mas não menos importante, o conforto de quem utiliza as edificações é ponto primordial para quem aluga, opera e/ou mantém os edifícios. “Os edifícios devem ser human centered, ou seja, pensados no conforto de quem os utiliza, colocando-os como ponto central. Este último item tem na automação predial um aliado insubstituível, graças às suas imensas potencialidades”, observa Ana Lúcia.
Investidores e usuários finais têm percebido que os custos de operação de um edifício são muito maiores que os da própria construção ao longo da vida útil do edifício. Ferramentas como a automação predial podem baixar muito o Total Cost Ownership (TCO) dos projetos. Estima-se que o investimento em automação predial gire em torno de 3% do valor total da obra, enquanto a redução no custo de operação se aproxima dos 30%.
Com o avanço dessa percepção, o momento atual tem sido favorável para o crescimento do segmento.
Efeitos da pandemia
O mercado imobiliário, tanto de vendas de novos empreendimentos como de locação, tem mostrado variáveis importantes, mas ainda não consolidadas. Com certeza, um dos efeitos da pandemia será a necessidade de maior controle de uso das edificações, valorizando muito também o gerenciamento remoto. Mudanças na arquitetura e no uso dos ambientes de uso comum também devem impactar o setor. E, desta vez, as considerações sobre a saúde e o conforto ambiental dos usuários estarão cada vez mais em alta. Em todas estas tendências, a automação predial se enquadra e, portanto, a médio prazo, deve surgir uma demanda expressiva.
Certas tendências vieram para ficar e, frente a isso, a tecnologia predial será essencial em diversas situações. Muratori ressalta que o momento atual é de mudanças. “Inicialmente, haverá algum grau de improvisação, o que é necessário; em seguida, as áreas de arquitetura e construção serão envolvidas diretamente e, logo após, a automação predial deverá ser envolvida. E, então, teremos novas demandas se consolidando em breve”, estima.
Moisés Younes Quatrin menciona que, analisando o mercado de forma geral, muitas obras foram postergadas / atrasadas devido à pandemia, mas os setores hospitalar e farmacêutico aumentaram substancialmente seus investimentos. “Hoje, existem alguns fatores adicionais importantes para qualquer empreendimento, como a qualidade do ar que se respira e a facilidade de higienização dos comandos (os interruptores)”, explica.
Neste sentido, ele afirma que as soluções de automação de ar-condicionado central e interna dos sistemas destes sistemas, assim como keypads higienizáveis estão em evidência. “A automação fornece informação e soluções importantes nestas áreas, uma vez que contamos com linhas de keypads totalmente higienizáveis, controle por dispositivo próprio (smartphone/Tablet) e conseguimos medir e atuar em fatores importantes como a saturação dos filtros de ar-condicionado, para assim garantir a qualidade do ar respirado”, frisa.
Por um lado, a pandemia fez com que as pessoas pensassem melhor na qualidade do ar respirado dentro dos edifícios, mas, por outro, fez com que edificações inteiras ficassem mais desertas, despertando o interesse maior ainda em seus gestores para a correta utilização desses espaços durante esses períodos de menor quantidade de pessoas. “Mais do que nunca, o uso dessas áreas deverá ser o mais eficiente possível, sem deixar de ser seguro. Isso cada vez mais torna a Automação Predial essencial na vida dos administradores”, enfatiza Ana Lúcia Salmeron.
Evolução no Brasil
Após quase quatro décadas dos primeiros edifícios com automação no Brasil, os projetos estão, finalmente, começando a ter maior relevância em seus momentos iniciais. Hoje em dia, quando a edificação está ainda em concepção, já é possível se falar em eficiência operacional e preocupação com a sustentabilidade. Em um passado não muito distante, a automação predial era sempre deixada por último e, como em qualquer área da engenharia ou da vida, tudo que não se pensa no início, gera a perda de excelentes oportunidades de ganhos.
Em países mais evoluídos, a automação já começa desde o projeto inicial; contudo, na prática, isto ainda não é uma realidade na rotina das incorporadoras locais brasileiras. José Roberto Muratori esclarece que, quando se trata de projetos oriundos de países mais desenvolvidos, a automação já vem prescrita e precisa ser considerada, mas que quando o projeto surge localmente (a maioria dos casos), esta consciência ainda precisa ser adquirida. “É um processo de aprendizado, mas percebe-se cada vez mais que os investidores do mercado imobiliário corporativo estão incluindo a automação predial na pauta. Também não podemos nos esquecer de a que a obsolescência das edificações é um fato irrefutável e que as novas tecnologias permitem uma instalação mais simples e com menor grau de interferência na obra, potencializando um grande mercado de retrofits”, pondera.
As características do clima brasileiro exigem a instalação de sistemas de climatização complexos em todas as regiões do País, pois os sistemas de automação para ar-condicionado evitam o desperdício de energia e são essenciais na gestão dos edifícios. Automação de elétrica, iluminação, sombreamento, climatização interna, rateio e monitoramento de consumo, entre outros, contribuem também diretamente nos custos envolvidos para operação de uma edificação e automatizam muitas das demandas de manutenção dos mais diversos sistemas.
O que difere, não só o Brasil, mas a América Latina como um todo, é a dificuldade em pensar no longo prazo. Com uma cultura mais imediatista, o desafio em enxergar ganhos com intervalos de tempo maiores aumenta. “É muito comum ver um europeu pensando em como será a manutenção de uma área logo nos primeiros momentos de um projeto. Diferente do que é visto em outros lugares pelo mundo, como na Europa, onde a manutenção de uma área ou edifício é pensada logo, logo, nos primeiros momentos de um projeto, aqui, nós costumamos focar na velocidade da entrega e nas possibilidades de redução do custo na construção. Mas essa percepção do ganho de longo prazo tem começado a mudar no Brasil e a velocidade de implantação de sistemas prediais no País deve crescer muito nos próximos anos”, projeta Ana Lúcia.
O incremento na busca de certificações Leadership in Energy and Environmental Design (LEED), selo que garante que uma edificação teve uma visão sustentável em sua concepção inicial, é a prova de que há resultados efetivos. Em contrapartida, as incertezas políticas, o câmbio com diferenças altas e constantes e a falta de crédito para projetos sustentáveis interferem na tomada de decisão para a execução de investimentos nesta área.
Outro ponto que carece maior atenção é a formação de profissionais no País, seja de nível técnico ou superior, com enfoques direcionados ao aprendizado em eficiência e manutenção. Além disso, faltam pesquisas nacionais, avaliando e corroborando que essa ou aquela tecnologia ou técnica trouxeram ou não benefícios mensuráveis e orientações de como replicá-las.
No que tange à mão de obra, a princípio, Muratori relata que existem dois personagens principais: os projetistas e os integradores e explica que sem um projeto, normalmente, a atividade do integrador enfrenta grandes problemas, seja pela falta de infraestrutura adequada, da especificação deficiente dos sistemas e até mesmo da ausência de verbas previstas no orçamento da obra. “Logicamente, o papel do integrador é essencial para que um projeto seja implantado com qualidade. Atividades como uma correta especificação de sistemas, a integração deles, sua instalação e programação bem-feitas são as principais funções do integrador e sempre que um projeto é bem-sucedido proporciona a todos envolvidos a ideia da recorrência. Investidores, construtores, projetistas, integradores e, principalmente, usuários, todos saem ganhando com o êxito de um projeto”, declara.
Muitos dos edifícios comerciais não tiveram um projeto específico e, por isso, existe, inicialmente, uma dificuldade. Será sempre necessário, nestes casos, providenciar um levantamento detalhado das condições existentes. Mas, no momento, parte deste problema é superada pela facilidade de uso de vários equipamentos mais modernos que operam via rádio ou via Internet e utilizam menos infraestrutura da parte civil da obra. “Por isso, sempre enfatizamos a necessidade de um projeto que torna tudo mais simples”, recomenda Muratori.
Por muitas vezes, é necessário fazer adaptações ou mesmo construir uma infraestrutura totalmente nova. Para os projetos mais antigos, onde o conhecimento de automação não era tão popular quanto hoje, na maioria dos casos, será necessária uma intervenção na infraestrutura. “Para os projetos novos, a engenharia responsável pelo projeto tem um papel fundamental nesse processo, propondo a implementação da automação ou minimamente a infraestrutura para que futuramente o empreendimento possa receber automação, conforme decisão do investidor ou cliente final”, justifica Moisés Quatrin.
No entanto, Ana Lúcia Salmeron afirma que a automação predial tem ganhos comprovados e nem sempre precisa começar com grandes ações. “Projetos podem começar de forma modular e ir crescendo com o tempo. Para tal, é altamente recomendado contar com empresas de projeto experientes que possam montar um planejamento futuro, dividindo as execuções em fases”, orienta.
O futuro da automação
No dia 30 de novembro de 2020, foi publicada a nova norma ABNT NBR IEC 63044-1:2020 – e complementares. O documento é destinado principalmente aos fabricantes de produtos e abrange regras e recomendações que envolvem:
• Estações de operação e outros dispositivos de interface homem-sistema;
• Dispositivos para as funções de gestão;
• Dispositivos de comando, estações de automação e controladores específicos para uma aplicação;
• Dispositivos de campo e suas interfaces e
• Cabeamento e interconexão dos dispositivos.
Trata-se de recomendações importantes, mas não obrigatórias. “Com certeza, os fabricantes que adotarem estes princípios sugeridos nos seus produtos pode ter uma vantagem competitiva no mercado”, revela Muratori.
É inegável que ainda falta uma “cultura” da automação devidamente propagada a todos os agentes envolvidos e que o País está vivendo um momento de redução de custo dos equipamentos e de maior oferta de serviços complementares, como acesso à Internet e suas diversas variantes, quantidade crescente de aplicativos de uso intuitivo, tanto por gestores como usuários, entre outros. “Temos menos fatores impeditivos do que poucos anos atrás, portanto; reunimos condições favoráveis para que esta expansão ocorra muito em breve”, prevê Muratori.
Neste sentido, a Aureside conta com um projeto denominado Prédio Eficiente, que procura reunir um acervo técnico e informativo sobre o assunto, congregando especialistas e empresas que se dedicam ao setor no País. “Neste ano de 2021, a 17ª edição do Congresso Habitar , a ser realizada em setembro, terá todo o seu conteúdo voltado ao tema da eficiência das edificações, reunindo especialistas, desde profissionais atuantes no mercado, professores e acadêmicos, além de representantes de entidades e órgãos governamentais. A ideia é um debate amplo sobre os desafios e oportunidades do setor”, conta o diretor-executivo.
Em relação ao crescimento, existem grandes incertezas em qualquer projeção atualmente, uma vez que o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro tem mudanças frequentes em suas estimativas. A mais recente fala em torno de um crescimento de 20% entre 2021 e 2025. As projeções de sistemas de automação são bem superiores, pois partem de uma base ainda pequena. Existe margem para um crescimento acumulado de até 100% neste mesmo período.
Para saber mais sobre o mercado de automação, acesse: www.aureside.org.br e: www.predioeficiente.com.br.