As contas apresentadas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) sobre custos da geração própria de energia renovável e o eventual repasse aos consumidores via Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) são incompletas e desconsideram os benefícios econômicos, sociais e ambientais do uso da energia solar nos telhados e pequenos terrenos ao setor elétrico à sociedade e ao País.
A avaliação é da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (ABSOLAR). Segundo a entidade, além da falta de transparência do regulador, que não disponibilizou a memória dos cálculos apresentados, as contas apontam na realidade o volume financeiro que os consumidores de energia pagarão para proteger as margens de lucro das distribuidoras, uma vez que a geração própria de energia reduz a receita das concessionárias e pode promover a redução da tarifa de todos os consumidores.
“A ABSOLAR e o setor solar fotovoltaico brasileiro trabalham para garantir que a geração própria de energia solar seja tratada de forma justa e equilibrada, conforme determina a Lei nº 14.300/2022 (marco legal do setor). Os benefícios da geração distribuída devem ser devidamente identificados e incorporados nas contas e na regulamentação do mercado, como estabelece a lei”, explica Rodrigo Sauaia, presidente executivo da ABSOLAR.
Estudo recente da consultoria especializada Volt Robotics, encomendado pela ABSOLAR, aponta que o crescimento da geração própria de energia solar deverá trazer mais de R$ 86,2 bilhões em benefícios sistêmicos no setor elétrico para a sociedade brasileira na próxima década. Com isso, a geração distribuída vai baratear as contas de luz de todos os consumidores, inclusive os que não tiverem sistema solar próprio, em 5,6% até 2031.
Quando se avalia os subsídios separados por fontes que estão presentes na CDE, a discrepância torna-se ainda mais evidente. Somente neste ano, os consumidores brasileiros pagarão cerca de R$ 11,9 bilhões de rateio para as termelétricas fósseis a partir do diesel e quase R$ 1 bilhão para o setor de carvão, segundo dados da própria Aneel (https://portalrelatorios.aneel.gov.br/luznatarifa/contadesenvolvimento#).
Por outro lado, os benefícios da geração própria de energia solar também foram medidos durante a grave crise hídrica que assolou o Brasil em 2021 e aumentou severamente as contas de luz dos brasileiros, com a bandeira tarifária no patamar mais elevado, a chamada “bandeira de escassez hídrica”. Segundo cálculos do próprio Ministério de Minas e Energia (MME), a crise hídrica representou custos da ordem de R$ 28 bilhões aos consumidores, que ainda não foram integralmente pagos.
Com a geração de energia solar junto à carga, ou seja, nos próprios locais de consumo, foi evitado um custo adicional de R$ 13,6 bilhões, que poderiam vir com mais despacho de termelétricas fósseis e caras para o suprimento energético. Se não fossem os sistemas solares dos próprios consumidores, o custo da crise hídrica ao País teria sido de R$ 41,6 bilhões, cerca de 48,6% a mais na conta de luz dos brasileiros.
Para Guilherme Susteras, coordenador do grupo de trabalho de geração distribuída da ABSOLAR, a regulamentação do marco legal é estratégica para o futuro da geração própria de energia renovável no Brasil e fundamental para o desenvolvimento sustentável do País. “Por isso, é necessário que o processo de definição de regras tenha uma reflexão aprofundada e compatível com a abrangência e importância do tema para a sociedade brasileiras”, destaca.
“A ideia é justamente garantir que a geração própria de energia renovável receba o tratamento correto, adequado e condizente com as necessidades do País, de modo a maximizar os benefícios que podem proporcionar a todos os cidadãos”, conclui Susteras.
Estudo dos benefícios da geração própria de energia solar
O estudo, intitulado “Contribuições da geração própria de energia solar na redução das contas de luz de todos os brasileiros”, apresenta as contribuições da geração distribuída solar para a redução dos preços de eletricidade no País e traça cenários futuros com as projeções de redução das tarifas de energia elétrica para todos os consumidores, a partir da inserção dos sistemas solares distribuídos, nas áreas urbanas e rurais.
A partir do cenário oficial de crescimento projetado para a geração distribuída do Plano Decenal de Expansão de Energia 2031 (PDE 2031), de autoria do MME e da EPE, a geração distribuída saltará dos 9,4 gigawatts de potência instalada no início de 2022 para aproximadamente 37,2 GW em 2031. Com isso, em cenários médios, a frequência de acionamento da bandeira vermelha nas tarifas de energia elétrica deve ser reduzida em cerca de 60% para os consumidores brasileiros até 2031. Já no caso de cenários com a possibilidade de nova crise hídrica, como as sofridas pelo Brasil em 2001, 2014 e 2021, a diminuição da ocorrência das bandeiras tarifárias mais caras aos consumidores chega a 17%.
Adicionalmente, em relação ao custo da energia elétrica no País, rateado e pago por todos os consumidores, o crescimento da geração distribuída solar representará o barateamento de R$ 34 bilhões nos custos repassados aos consumidores. Isso proporcionará uma redução de 2,2% nas tarifas de energia elétrica na próxima década.
Em relação aos encargos setoriais, custos que também são arcados pelos consumidores brasileiros, a redução será de R$ 11,5 bilhões até 2031, trazendo uma queda de 0,8% nas tarifas de energia elétrica. Segundo o estudo, outro benefício será a redução do risco financeiro sobre a variação dos preços dos combustíveis, outro custo coberto pelos consumidores, com queda de R$ 24,2 bilhões e 1,5% a menos nas tarifas da população.
As reduções das perdas elétricas nas linhas de transmissão e redes de distribuição trarão economia adicional de R$ 8,2 bilhões em dez anos, garantindo aos brasileiros uma queda de 0,5% nas tarifas de eletricidade. O estudo também projetou o alívio trazido pela geração distribuída sobre a demanda no horário de pico do sistema elétrico brasileiro, registrado atualmente entre 10h e 16h, período no qual a geração distribuída solar tem maior capacidade de geração e entrega de energia elétrica ao sistema. Nesse caso, a redução calculada é de R$ 1,6 bilhão no período.
Outro benefício identificado e mensurado pelo trabalho é o efeito da geração distribuída solar na redução de preços entre os submercados elétricos do Nordeste e Sudeste, estimado em R$ 8,5 bilhões até 2031, trazendo uma queda de 1,5% nas tarifas dos consumidores. Na prática, os sistemas fotovoltaicos nos telhados e pequenos terrenos diminuem a sobrecarga dos sistemas de intercâmbio, diminuindo os custos da energia elétrica para quem compra e consome no Sudeste e melhorando os patamares de preços de quem vende energia produzida no Nordeste.
O estudo traz, ainda, a projeção de redução de emissão de gases de efeito estufa, que nos cenários médios chega a 67 milhões de toneladas de CO2 até 2031. Já no cenário de uma nova crise hídrica, com maior acionamento de termelétricas mais caras e poluentes, a redução dos gases do efeito estufa seria de 121 milhões de toneladas de CO2.
Os dados da consultoria Volt Robotics se concentraram no cálculo dos chamados “benefícios sistêmicos ao setor elétrico” e não incluem demais ganhos socioeconômicos e ambientais, como a atração de investimentos privados, a geração de empregos, o aumento da renda, o aumento do poder de compra da população e os ganhos para a sustentabilidade do País, benefícios estes também estratégicos ao Brasil e trazidos, de forma significativa, pelo crescimento da geração distribuída solar.